O inadimplemento fiscal não deve ser confundido com fraude fiscal ou fraude à lei tributária. Embora haja infringência dos deveres tributários, é preciso realçar que são institutos diferentes e que se operam de modo diverso um do outro, especialmente pela presença ou não do dolo no ato que resultar no não recolhimento do tributo.
Nesse sentido, entende-se por mero inadimplemento fiscal o comportamento do sujeito passivo que resulta no não cumprimento da obrigação tributária principal, seja de forma voluntária ou não. Trata-se de ação desprovida de meio ardil tendente a ocultar da Autoridade Fiscal o conhecimento da relação tributária subjacente, erigida da ocorrência do fato gerador do tributo.
Na maioria dos casos, a não satisfação da obrigação tributária decorre da simples ausência de disponibilidade financeira para honrar o compromisso. Todavia, não raro, há o cumprimento das obrigações tributárias acessórias, especialmente no que se refere a emissão das notas fiscais e do registro dos fatos na contabilidade e, acima de tudo, ocorre a declaração dos mesmos ao fisco.
Diversamente ocorre na fraude fiscal ou na fraude à lei tributária, cujos institutos são diferentes entre si. A primeira implica em grave violação dos deveres tributários e, geralmente, estão associados à falsificação de documentos e livros fiscais, institucionalização de caixa dois, entre outros. Trata-se de típico fenômeno descrito como evasão (sonegação fiscal), caracterizado por um ataque direto ao ordenamento tributário. Em regra, referidos comportamentos são praticados após a ocorrência do fato gerador do tributo e são empregados para encobrir o conhecimento da verdade real.
A segunda consiste em procedimentos sofisticados e articulados para evitar a ocorrência do fato gerador dos tributos ou para caracterizá-lo de modo diverso daquele estatuído pelo legislador. Diferente da fraude tributária, onde há a burla da regra tributária por via de comportamentos diretos, a fraude à lei tributária se caracteriza pela tentativa de frustrar a incidência da regra tributária. Está sempre associada aos comportamentos simulatórios e/ou dissimulatórios, razão pela qual é praticada antes da ocorrência do fato gerador ou após. A doutrina especializada a classifica como elusão fiscal.
Na fraude tributária, quanto na fraude à lei tributária, há uma ação consciente, espontânea, dolosa ou intencional do sujeito passivo de, através de meios ilícitos ou inadequados, evitar, elidir, reduzir ou retardar o pagamento dos tributos, cujos comportamentos não configuram elisão fiscal ou planejamento tributário.
A lei federal nº 4.502/1964, em seus artigos 71, 72 e 73, conceitua sonegação fiscal, fraude e conluio. Por sua vez, a lei federal nº 4.729/1965, em seu artigo 1º, define os comportamentos caracterizadores do crime de sonegação fiscal, ao passo que lei federal nº 8.137/1990, em seus artigos 1º e 2º, trata dos crimes contra a ordem tributária.
Acerca das distinções aqui traçada, cumpre trazer à colação excerto do acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, em sede do julgamento do Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 86.565/SP, assim se expressou:
“[…]. A conduta de inadimplir o crédito tributário, de per si, pode não constituir crime. Caso o sujeito passivo declare todos os fatos geradores à Administração Tributária, conforme periodicidade exigida em lei, cumpra as obrigações tributárias acessórias e mantenha a escrituração contábil regular, não há falar em sonegação fiscal (Lei n. 8137/1990, art. 1º), mas em mero inadimplemento, passível de execução fiscal. Os crimes contra a ordem tributária, exceto o de apropriação indébita tributária e previdenciária, pressupõem, além do inadimplemento, a ocorrência de alguma forma de fraude, que poderá ser consubstanciada em omissão de declaração, falsificação material ou ideológica, a utilização de documentos material ou ideologicamente falsos, simulação, entre outros meios. […]”. (Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 86.565/SP. Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, Dj. 21/02/2019.
À luz disso, as infrações tributárias, de per si, implicam em manifesto descumprimento do mandamento prescrito na legislação e independem da intenção do agente, razão que pela sua responsabilização é de cunho objetivo. Significa dizer que, para fins da imposição da sanção legal, é irrelevante os motivos pelos quais o sujeito passivo transgrediu o comando normativo (art. 139 – CTN).
Por outro lado, as fraudes tributárias e as fraudes às leis tributárias, por configurarem condutas puníveis na seara do direito penal tributário ou do direito tributário penal, requerem para suas configurações a demonstração da conduta lesiva ao erário, a qual, não raro, é praticada de forma deliberada e consciente, naquilo que a doutrina especializada denomina de dolo. Eis o motivo das leis federais (LF) de números 4.502/1964 (Dispõe Sobre o Imposto de Consumo e reorganiza a Diretoria de Rendas Internas), 4.729/1965 (Define o crime de sonegação fiscal e dá outras providências) e 8.137/1990 (Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências) serem invocadas para capitular as infrações cometidas, ante suas inserções no campo sancionatório do direito penal.